Como superar o conflito de ideologias e a polarização no Brasil
Como psicólogos, compreendemos que a mente humana é construída a partir de suas relações sociais. E isso passa pela cultura e ideologia.
Nesse artigo, reflito sobre o quanto nós brasileiros nos tornamos conflituosos em diversos níveis sociais, e porque esses conflitos são necessários para a criação de uma nova identidade nacional livre e solidária.
ÍNDICE DE CONTEÚDO
Conflitos e ideologias na sociedade moderna “líquida”
Vivemos uma era chamada por Zygmunt Bauman de “modernidade líquida”. Nossas relações com pessoas, ideias, religiões, política e cultura já não são mais estruturadas sobre conceitos hegemônicos sólidos e duradouros. Ao contrário, hoje nossas relações são “líquidas”, fluidas, em constante mutação – o que gera na sociedade uma espécie de ansiedade por não sentirmos mais a segurança e a estabilidade que nossos avós vivenciavam a 80 anos atrás.
Os efeitos dessa modernidade líquida sobre nossas relações são inúmeros. Dentre eles estão o aumento no número de ideias controversas que temos contato atualmente.
Inúmeras vozes (antigas e contemporâneas) fazem denúncias todos os dias nos meios de comunicação cada vez menos polarizados (como a internet e as redes sociais), evidenciando realidades que antes estavam obscurecidas pela ideologia antes dominante.
E essa nova forma de exposição de realidades e representações sociais alternativas geram, por sua vez, os conflitos.
Podemos notar isso nas fortes repercussões em relação às mortes violentas de George Floyd e João Alberto Silveira Freitas vistas durante a pandemia do novo coronavírus de 2020 e 2021.
Na história recente, nunca estivemos tão divididos.
Já não se fala mais do “brasileiro amigável” (conceito em si uma representação social). Briguentos, ideológicos e radicais, estamos abrindo cada vez mais o abismo que separam famílias, grupos, partidos e classes sociais.
Mas, ouso dizer, isso é bom.
Como limpar um balde de água podre?
A sabedoria popular nos diz há muito tempo que não é possível não sentir o fedor de balde de água podre ao tentar lavá-lo.
É preciso ir lá, tirar o balde do lugar, mexer naquela água e ver o que pode ser feito – e isso fará seu nariz sofrer.
O balde de água podre, você já deve ter imaginado, representa as injustiças sociais que o Brasil ainda não conseguiu lavar.
Esse balde estava quieto, esquecido no canto da casa (nossa nação), tapado e subjugado por grandes forças de opressão e instrumentos ideológicos.
Mas em detrimento dessa nova modernidade, o baldo começa a apresentar pequenos furos “criminosos”. Vozes que jogam nas timelines das redes sociais e nos Whatsapps o sofrimento de milhões de brasileiros, fazendo escorrer o sangue dos cidadãos vítimas de uma grande opressão e injustiça.
E o balde precisa ser lavado.
De pouco se aproveita negarmos os fatos e evitarmos o conflito tapando o sol com a peneira. Ou deixando o balde podre esquecido num canto escuro da casa.
Uma nação livre e solidária
Para fazermos nascer uma nação livre, é preciso “por a mão na merda”, entender o que nos divide, encarar essas realidades distantes e colocá-las em discussão para que a nação seja curada.
Com coragem, respeito e cidadania, colocar na mesa o que impede a libertação das consciências dos cidadãos de todas as classes, raças, religiões e etnias. Naturalmente esse processo crítico pelo qual vive a nação brasileira passa pelo conflito.
Esse conflito “adolescente” que existe hoje no país (um conflito egoísta e imaturo) é necessário.
Ele denuncia as injustiças e as incoerências nacionais que foram obscurecidas por séculos, e tem o poder de soltar as vozes dos oprimidos esquecidas nos cantos do país para alcançar a polis – o espaço de debate democrático – de modo contundente.
Ideal seria que, após um período turbulento de discussões e conflitos, essa nação adolescente possa amadurecer e se apaziguar.
Ideal seria que possamos, inclusive, e dependendo do espectro político, tomar a decisão democrática entre limpar o balde (com políticas mais conservadoras) ou substituí-lo (com políticas mais progressistas) para podermos seguir em frente enquanto povo brasileiro.
Felizmente temos exemplos históricos de nações – dentre elas a África do Sul – que, com muita luta, conseguiram fazer isso: criar minimamente uma identidade nacional, menos briguenta e pautada pela dominação, e mais coletiva, pautada pela solidariedade e identificação mútua.
Então tapemos os narizes, caros cidadãos brasileiros, e sigamos em frente. Estamos só começando.
Se cuidem